terça-feira, 25 de outubro de 2011

As Cervejas Lambic



Boon Oude Gueuze Mariage Parfait

Esses dias tive a honra de tomar um estilo de cerveja repleto de histórias e tradições. A sensação causada foi tão boa que resolvi pesquisar mais a fundo sobre essas cervejas tão peculiares. O que encontrei é muito interessante e resolvi fazer um post para compartilhar com vocês.

Sugiro abrir uma boa cerveja e viajar, lendo o texto com calma e atenção!

Pinturas datadas do séc XIV mostravam cerveja sendo alegremente despejada de seus jarros de cerâmica. O incrível é que essa cerveja ainda é feita hoje e exatamente da mesma maneira como era produzida naquela época.

Lambic provavelmente deriva de Lembeek, pequena cidade belga, grande reduto de cervejarias produtoras do estilo. Nelas, as janelas estão sempre abertas para que a natureza adentre ao local, e ela é muito bem vinda. Além disso, telhas quebradas, tábuas faltando no telhado, e até mesmo teias de aranha são comuns nas cervejarias lambic. Esta é a maneira que muitas cervejas eram fermentadas a centenas, ou mesmo milhares de anos atrás, quando mesmo as cervejarias mais avançadas não faziam a menor idéia do que era uma levedura. Naquele tempo, as cervejas sofriam uma fermentação espontânea por levedos e bactérias existentes no ar.

Hoje em dia, entretanto, isso não pode ser feito em qualquer lugar, mas em Lembeek, a microflora presente no ar produz algumas das mais complexas e fascinantes cervejas do mundo. Este processo remoto propicia as lambics sabores frutados, diferentes, complexos, com paladar fortemente ácido. 

Mas as curiosidades do estilo não estão apenas na fermentação inusitada que ele sofre. Os grãos e os lúpulos também entram de maneira diferente.  Apesar da grande parte do corpo da cerveja ser feito de cevada maltada, ela recebe também boa porção de trigo não maltado. Os lúpulos que entram na composição, geralmente são envelhecidos, fazendo com que eles percam muito do seu poder de amargor, mas seu poder de conservante natural continua intacto e irá promover o equilíbrio entre os levedos e as bactérias durante a fermentação.


As cervejas lambics são sempre fermentadas em barris de madeiras, por onde já passaram vinho xerez ou vinho do porto. Isso é parte fundamental do processo, e ela não pode ser considerada lambic se isso não ocorrer. Nos barris a fermentação irá interagir com o líquido, e cada um deles tomará rumos diferentes. O resultado é imprevisível e não padronizado. Isso é visto como algo terrível para qualquer cervejaria, mas os produtores de lambic consideram o fato um verdadeiro tesouro.

Hoje é raro vermos lambic sendo vendidas sem sofrer qualquer tipo de mistura com outra cerveja. Lambics puras são muito secas, incrivelmente complexas e quase não há carbonatação. Cervejas jovens são audaciosamente ácidas, já as mais envelhecidas são mais macias e complexas. O que acontece quando ambas são misturadas?

O resultado é um novo estilo de cerveja: o Gueuze.

Trata-se da combinação das qualidades mais sedutoras da lambic jovem e envelhecida em uma cerveja notavelmente complexa e refrescante.

O mais incrível é que depois que a combinação é feita, a cerveja continua fermentando. Misturar as lambics é um trabalho de pura arte e muito parecido com a combinação de Scotch Whisky, pois cada barril de lambic é diferente.

A tarefa do Blender (o responsável pela mistura) é ver o que melhor pode ser feito com cada barril, e as possibilidades são inúmeras. Se ele achar que uma cerveja está evoluindo muito bem, ele pode a deixa-la descansar mais tempo e talvez vende-la como uma lambic pura ou usá-la novamente para fazer uma excelente gueuze. Ele pode ainda encontrar algum barril mais adequado para a adição de uma fruta o que resultaria em outros estilos de cerveja. A proporção de cerveja jovem e envelhecida cabe ao blender decidir. Depois de combinado as cervejas podem ser vendidas ou ainda ser maturadas novamente.

Essas cervejas continuam fermentando na garrafa, e com o passar do tempo elas terão seu sabor alterado. Fica a cargo do consumidor quando beber sua garrafa, entretanto, ao despejá-la no copo devemos ter cuidado para não colocar o fermento que está no fundo da garrafa.


Safra

Reparem na validade.


Cervejas lambics são do tipo ame ou odeie. Eu tive a chance de tomar uma gueuze e achei incrivelmente complexa e divertida. Então eu recomendo a experiência! São poucas as que chegam até nós, na realidade não existe muitas cervejarias que produzam. Mas vale a pena procurá-las.

Vamos à cerveja que eu tomei:

Cervejaria Boon:

O mestre-cervejiro Frank tem cerveja correndo nas suas veias. Sua avó comandou uma cervejaria quando Frank era jovem, mas ela passou por tempos difíceis e faliu em 1970. Frank prometeu a seus familiares não ser um mestre-cervejeiro, mas ao ver sua avó fazer cerveja em casa, o processo o fascinou. A família se mudou para Lembeek e a única pessoa que Frank conhecia lá era  o senhor De Vits, um cervejeiro local. Frank tinha dezenove anos, Vitz sessenta e oito e estava um pouco de saco cheio do seu negócio. Frank sentiu um formigamento no corpo e decidiu que quebraria sua promessa. Começou a comercializar cerveja e juntou uma grana para finalmente comprar a cervejaria de Vitz. Seu desejo era fazer a tradicional lambic com extrema qualidade, sabendo que nenhuma mega cervejaria se sujeitaria a todo investimento e trabalho que o antigo estilo de cerveja requer. Frank Boon teve sucesso, como mestre-cervejeiro e como homem de negócios e hoje suas cervejas são bem distribuídas por todo o mundo. Uma curiosidade é que os barris onde ele fermenta suas cervejas foram feitos na Alemanha a centenas de anos atrás e foi dado a Bélgica como pagamento após a Primeira Guerra Mundial. Os nomes das antigas cervejarias alemãs ainda podem ser lidos nos barris.

A cerveja:





·         Nome:  Boon Oude Gueuze Mariage Parfait

·         País de Origem: Bélgica

·         Onde encontrar: Lojas Especializadas e Lojas Virtuais

·         Prêmios: ?

·         Fermentação: Espontânea. Realizada pela microflora presente no ar.

·         Estilo no BJCP: 17E

·         Características: Clara a âmbar, seca, divertida, complexa, bem ácida.

·         Ingredientes: Água, malte de cevada, trigo, lúpulo envelhecido.

·         Teor Alcoólico: 8,0%

·         Temperatura Ideal: 4 a 8 Cº

·         Harmonização: Mexilhões, camarões, salmão defumado, ostras e queijos de cabra.

·         Envase Avaliado: 375ml

Minha Avaliação
Alaranjada, polida, com creme branco e consistente e de formação vulcânica mas que perdurou por tempo médio. Aroma complexo lembra um pouco mofo, lã e celeiro, tem um forte frutado cítrico, leve adocicado e um floral muito bom. É muito interessante pois a cada momento sentimos um deles mais forte. Na boca ela é sensacional, uma das melhores que já tomei. A primeira percepção é a de bolhinhas estourando, típica de cervejas com carbonatação altíssima. Super refrescante, é perfeita para começar um jantar, como se fosse um aperitivo. Os sabores são adocicados e frutados (maçã), um pouco de metálico. Mas tudo isso no final é sobreposto pelo melhor amargor que já senti em uma cerveja, ele literalmente parece ter sido temperado. Também temos uma afiada e agradável acidez. Bem seca. Retro gosto ácido e amargo. Os 8% de álcool são imperceptíveis. Corpo leve-médio. Seu cárater geral lembra o de um champangne, porém, é muito mais complexa e selvagem. Excelente cerveja, a experiência é indispensável. Eu gostei demais dela. Um verdadeiro show das leveduras! 

Fim de Papo! E aí, já terminou sua cerveja?

Fale a verdade, quando conhecemos a história do que estamos consumindo, damos outro valor e passamos a apreciar de modo mais legal e inteligente aquele momento e o produto que temos em mãos.

Grande Abraço!



Saúde!


2 comentários:

  1. Fala João, blz?

    Cara, eu sou de São Caetano! Não sei onde você compra suas cervejas, mas não me lembro de ter visto essa no empório onde compro as minhas..rs.

    Tem alguma dica de onde posso encontrá-la e o preço médio?

    Valew e parabéns pelo post, fiquei com muita vontade de experimentar essa breja! Abraço!

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  2. Fala Rubão! Confrade, em São Caetano talvez no Emporio Good Fellas tenha. Eu comprei a minha na Adega & Emporio ABC. Fina na AV Lino Jardim em Santo André. Na época paguei 28 reais;

    Grande abraço e obrigado pelo elogio!

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